sexta-feira, 4 de maio de 2012

REZANDO NA CARTILHA LIVRE DE RITA LEE

Coberta por expectativas e curiosidade, Rita Lee lança o primeiro álbum de composições inéditas desde 2003. No novo Reza, editado pela Biscoito Fino, Rita segue a bem sucedida parceria com Roberto de Carvalho em 14 músicas que comprovam que a pena da dupla continua afiada, moderna e cheia de surpresas. Foram nove anos longe das salas de gravação mas em contato direto com o público em shows pelo país. Em contraponto o disco foi gravado em retiro caseiro no estúdio montado pelo casal, que também somou a colaboração do produtor Apollo 9. A idéia original era lançar um álbum com releituras para clássicos do cinema, mas o repertório inédito se impôs naturalmente como prioridade adiando o anterior. O resultado é um saboroso drops de sabores variados e surpresas no caminho, mantendo a marca de Rita e Roberto. Durante as gravações Rita Lee soltou trechos de músicas em seu site, chegando a apresentar na íntegra o delicioso rock As loucas. Ali estava sua eterna história de uma mulher moderna – a música tem parentesco com Todas as mulheres do mundo e com as musas Luz del Fuego e Elvira Pagã. Disco pronto, foi a vez da faixa título virar sucesso espontâneo assim que lançada na internet. Logo chegou ao topo das paradas de rádios, no horário nobre da trilha sonora da novela e até no ranking do Itunes. Na loja virtual se estabeleceu em primeiro lugar desbancando a dominação de neo-sertanejos, ídolos teens e pops-axés. A bem vinda Reza se adiantou como um petisco do ótimo repertório inédito. Personalíssima, só Rita pode vestir a personagem do auto-escracho sem perder (jamais) a elegância. Nessa linha estão Tô um lixo e Vidinha, reclamações muito bem humoradas, além da refri-junkie Gororoba, rock básico para apreciar sem moderação. Sua eterna Carmen Miranda volta atual no eletro-baticum-tropicalista Paradise Brasil, faixa feita apenas por Rita e Roberto – da composição a execução, assim como outras ao longo do álbum. Ela se reveza em vozes, vocais, percussão, flautas e teremin; ele nas guitarras, violões, vocais e teclados de sempre mas aqui também em gaitas, programações, loops e baixos. Reza ainda abre espaço para mais ousadias. Logo na primeira faixa Rita puxa a ladainha na oração Pistis Sophia, acompanhada apenas pela percussão do lendário João Parahyba. Do orgânico ao eletrônico, no fim do álbum experimenta na instrumental Pow um interplanetário solo de seu theremin. No meio do caminho a eletrônica também veste a história da Cybernerd girl de Bixo grilo. O disco oferta mais surpresas. Se em 1993 Rita levou a sério o idioma italiano em Dami mile bacci (parceria com Carlos Rennó), agora é a vez de se divertir com o sotaque na hilária Tutti fuditti evocando um Adoniran pop sem compromisso. Hábil em brincar com o português, Rita já se mostrou a mesma aptidão com inglês e francês. Ainda desenrola línguas com desenvoltura nas rimas de Bagdá (que mistura “Tabouli esfiha kibe humus vatapá”)e no samba-rock Bamboogiewoogie, com ares de Trio Mocotó e levadas latinizadas. Na sensual e apaixonada bossa Rapaz segue a viagem “Rapaz / Se você quiser / Fugimos pro Tibet”. Criadores da linguagem pop-brasileira, Rita Lee e Roberto de Carvalho seguem numa serena vanguarda celebrando a liberdade de não se ajustar a rótulos. O repertório de Reza é forte, reserva surpresas sem deixar de lado a marca da bendita dupla criativa que mantém a tradição de se reinventar. Amém. Por Beto Feitosa publicado no site Ziriguidum em 04/05/2012.

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