terça-feira, 31 de janeiro de 2012


A despedida de Rita Lee
por Paulo Moreira Leite

Se o show em Sergipe foi mesmo a despedida de Rita Lee – torço para que ela mude de ideia algumas vezes — eu queria dizer que foi uma cena final à altura dos melhores momentos do rock. Ela está de parabéns.

Vamos combinar: roqueiros bem comportados, que só dizem aquilo que combinaram com a turma do marketing e cometem gestos de rebeldia simulada que não arranham nem incomodam ninguém são insuportáveis.

Os marqueteiros querem transformar roqueiros em monges. O pior é que muitos se submetem. Não aguento, por exemplo, o jeito bom moço de Bono, que vem ao Brasil dizer como é que o governo deve cuidar dos pobres. Ou as inquietações sociais de Madonna com a infância carente, a ponto de querer visitar uma escola pública. Ou aqueles tantos contestadores de butique.

Não tenho a menor condição de julgar se Rita Lee estava certa ou errada na confusão sergipana.

Mas lembro que os roqueiros não precisam estar certos para ter razão. Às vezes, eles falam coisas certas mesmo por gestos errados.

Lembro dos sucessivos escândalos de Beatles e Rolling Stones, muitos deles inconvenientes, tortos, que ajudaram a mostrar o provincianismo da sociedade daquele tempo. Não dá para esquecer a perseguição sofrida por roqueiros solidários com a juventude que resistia a Guerra do Vietnã. Lembro de Serge Gainsborough, que não era roqueiro mas tinha o espírito. Eu estava na França quando ele fumou uma nota de 500 francos num programa de TV. Foi processado.

Rita terminou a noite numa delegacia. Glória. Isso diz muito sobre nós.

Todos os palavrões que Rita Lee empregou para se dirigir a PM de Sergipe estavam na boca de boa parte dos jovens brasileiros. Penso no estudante da USP que apanhou de um soldado porque não quis mostrar a carteirinha. Penso em quem assistiu a ação no Pinheirinho. Você sabe: a lista de exemplos é bem maior. Em vários pontos do país o tratamento que a PM dispensa aos jovens provoca revolta e indignação.

Rita Lee nunca teve medo de dizer, em plena ditadura, quando a PM agia à solta: “Roqueiro brasileiro sempre teve cara de bandido…”

Eram outros, tempos, claro. A criminalidade era outra. Bandido queria dizer outra coisa. Por isso era bom, divertido. Sou a favor da PM. Acho que o país precisa de um bom aparato policial, com policiais bem pagos e bem treinados.

Mas está na cara que a PM precisa reaprender a lidar com a juventude.

Parabéns, Rita Lee.

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